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  EDUCAÇÃO & LITERATURA

 

PÓS-MODERNO: ALGUNS SUBSÍDIOS PARA UMA CONCEITUAÇÃO

Josué Geraldo Botura do Carmo*

dez/2003

JOSUÉ GERALDO BOTURA DO CARMO


 

 

 

"a interdisciplinaridade não se ensina nem se aprende,

apenas vive-se, exerce-se...é uma questão de atitude".

                                                                                                                        Ivani Fazenda

Para o pensamento marxista só há mudança subjetiva na sociedade quando há mudanças objetivas, mudanças nas bases econômicas. São as mudanças nas bases econômicas que determinam as mudanças de pensamento. São nos momentos de transição do modo de produção, como a passagem do mercantilismo para o feudalismo, e do feudalismo para o capitalismo, que se observa modificações culturais significativas na sociedade. A manufatura vai significar uma mudança radical  nas relações do trabalho. Por trás dos acontecimentos está a expansão mercantil, que de certo modo é a origem do Renascimento, com sua necessidade de dispor de uma forma de produção de mercadorias de maior volume, que desse ao seu fluxo um horizonte mais amplo e sem os limites e obstáculos da produção artesanal. A manufatura é essa forma nova de indústria que aumenta fantasticamente a capacidade produtiva, a produtividade, e o volume das trocas, apenas pelo ato de reunir, dividir e sincronizar o movimento conjunto do trabalho dos artesãos. Ela não abole o trabalho artesanal. Rearruma-o, através da introdução de um sistema de controle e regulação cronométrica que virá a ser a essência da relação do trabalho capitalista e a ossatura por excelência da modernidade. O relógio mecânico materializara-se então como instrumento disciplinar do trabalho em todos os cantos do mundo.

O pós-moderno tem início na década de 50 do século passado com a crise do capitalismo e do socialismo, com o advento das novas tecnologias e com as grandes transformações políticas, sociais, econômicas e culturais. É um movimento eclético, pluralista, que mistura tendências opostas sem nenhum conflito. Na década de 60 vamos assistir ao movimento da contracultura e a revolução sexual. Na década de 70 o movimento feminista e ambientalista. São movimentos de respeito às etnias e minorias, de contestação ao conservadorismo, ao consumismo e ao imperialismo, trazem consigo mudanças significativas na sociedade. São mudanças de caráter permanente, abrangente e difusa. É na década de 80 que se dá a terceira revolução industrial denominada científico-tecnológica. Nesse momento é que vamos delinear uma nova concepção política e econômica do mundo que alcança o seu ápice na década seguinte com o movimento neoliberal: o desmonte do Estado do Bem Estar Social, criado após a Segunda Guerra Mundial, e a liberação total do mercado. É a fase do capitalismo avançado com suas empresas multinacionais.

Questiona-se a objetividade da verdade, da história e das normas, desencadeando processos de descentralização e ruptura. Nesse momento as indústrias de serviço, finanças e informação triunfam sobre a produção tradicional. E na arte há a valorização da arte popular, talvez com a nova visão da sociologia que aponta para a riqueza da diversidade cultural. Diluem-se também os critérios tradicionais de definição da estética. Agora a arte não está só nos museus, ela está em toda a parte, assim como o conhecimento não está só nas academias. É o começo do fim do mito, dos rituais e das mistificações, nos campos da religião, da arte e da ciência.

E talvez a característica mais marcante da pós-modernidade seja a interdisciplinaridade, que rompe com as fronteiras das organizações das disciplinas, que se justificam apenas por questões meramente políticas e são entraves para o desenvolvimento de novos conhecimentos. A interdisciplinaridade não diz respeito somente às divisões entre domínios de estudos e disciplinas, ela diz respeito também a estrutura organizacional das instituições. Assim não adianta nas escolas, desde o ensino fundamental, instituir o trabalho com projetos, é preciso desmontar toda a sua estrutura convencional de salas de aula tanto no que diz respeito ao espaço como no que diz respeito ao tempo. Essa questão não tem como se resolver isoladamente, se faz necessário profundas transformações tanto da organização social como da orientação histórica. São estruturas culturais, econômicas e de poder que precisam ser revistas, não são apenas fusão de conteúdos e métodos, não são apenas ações multidisciplinares, embora estas possam ser o início do diálogo interdisciplinar, que o trabalho com projetos pode ajudar e muito na aprendizagem da interdisciplinaridade, em que vamos aprender a formar conceitos numa perspectiva de enriquecimento da linguagem tanto como meio de comunicação como instrumento de pensamento. Só vamos compreender  a interdisciplinaridade trabalhando com ela. No pensar do homem pós-moderno a vida  não tem um sentido único, mas muitos sentidos e “a descontinuidade, a ruptura e o caos são o nosso destino[1]”. É uma sociedade multicultural, em que o impulso e a espontaneidade superam a razão. Os objetos de mercado revelam-se personalizados e estetizados. O comportamento dos grupos sociais torna-se dirigido pelos mecanismos de comunicação de massa e a tecnologia avançada e em franco desenvolvimento acrescenta novos elementos à transformação do homem e de sua convivência com a sociedade. Na literatura podemos observar a descontinuidade e a quebra da seqüência previsível. São utilizadas todas as linguagens de forma intertextual, incorporando-se no texto fragmentos de vários autores de diferentes épocas e estilos e a valorização da metalinguagem. Rompemos com a forma de ler e explicar o mundo com referência no conceito de totalidade, em princípios e fundamentações. No intertexto são vários mundos que se entrecruzam.

A física quântica descobre partículas de corpos de massas desprezíveis, que não seguem leis de movimento regular e constante, obedecendo a deslocamentos erráticos, sem direção definida, levando a uma concepção de mundo de ordem e de caos, por sua vez a biologia molecular amplia o arco da desordem e os matemáticos fazem da teoria do caos a essência de uma nova matemática. A filosofia vê esse pensamento emergente no mundo da ciência e após uma análise, observando a arte, em particular a arquitetura e as artes plásticas, denomina esse momento de pós-moderno. E a novidade chega na economia, com o nome de flexibilidade. É o fim da regulação inflexível. A base da revolução é o computador, uma máquina binária que funciona por fluxos de informação e por isso opera num espaço-tempo pulsátil, o espaço-tempo das coisas móveis, efêmeras, fluidas, semelhante ao tirado da percepção de natureza estruturada no código genético e na biologia molecular.

“Em sua evolução, o capitalismo tornara-se um sistema contraditoriamente a um só tempo fluido e rígido. Mercê da especialização, implícita na regulação taylorista, moveu-se no conflito de uma potencialidade incrivelmente alta de expansão e um horizonte paradigmático estreito. Um paradoxo pleno de crise: o impulso fordista que aí se alimenta, leva o sistema ao desbarato dos fundamentos; a rotina fatigante do trabalho, ao desgaste e à neurose da classe trabalhadora (situação que Chaplin duramente denuncia em Tempos Modernos); o acúmulo de peças defeituosas em número crescente, à tendência da queda da produtividade e alta do custo persistentes, que o capital só a duras penas reverte. Só quando a tecnologia da microeletrônica advém, propiciando a flexibilidade produtiva do sistema (o computador é uma máquina autoreprogramável) e a refusão integrativa dos aspectos intelectual e manual do trabalho, o problema pode então ser encaminhado. Trocou-se a regulação taylorista (rígida) pela regulação toyotista (flexível), pondo-se fim a toda uma era de economia política. Morreu um mundo do trabalho baseado na unidade, no padrão, na totalidade; nasceu um outro baseado no efêmero, no fluido, na diversidade, os parâmetros do pós-moderno “. (MOREIRA, 1999)

No cinema vamos assistir ao revigoramento da ficção científica apontando o problema da regulação e do controle, tristes heranças da modernidade que a pós-modernidade ainda não conseguiu superar.

A pós-modernidade é acima de tudo a crise da representação espacial do mundo.

Se na sociedade industrial tínhamos a fábrica como local preciso de produção, a oposição entre empregadores e dirigentes versus classe operária, uma dimensão nacional do sistema, e uma hierarquia entre vários países com base em seu produto interno bruto, hoje temos uma certa dificuldade em identificar o local de trabalho, as relações não se situam com facilidade no tempo e no espaço, fazendo diluir a imagem das duas classes contrapostas, há uma mudança nas relações internacionais, dificultando a identificação do país, e do que é público e o que é privado, e mudou a hierarquia entre as nações, há países na vanguarda em alguns setores e atrasado em outros.

A pós-modernidade é uma nova concepção da razão e da racionalidade, não como elemento central ou único, mas abrindo-se à riqueza e à heterogeneidade da vida, irredutível a toda forma de pretensão universalista. Busca  o homem livre e autônomo paradeterminar sua própria história e sua vida. 

Um poema que representa bastante este momento é o da música Os tribalistas, cantada por Marisa Monte, Arnaldo Antunes e Carlinhos Brown, no disco de mesmo nome, e que diz: 

“Os tribalistas já não querem ter razão

Não querem ter certeza, não querem ter juízo nem religião

Os tribalistas já não entram em questão

Não entram em doutrina, em fofoca ou discussão

Chegou o tribalismo no pilar da construção”

........................................................................

“O tribalismo é um antimovimento

Que vai se desintegrar no próximo momento

O tribalismo pode ser e deve ser o que você quiser

Não tem que fazer nada basta ser o que se é

Chegou o tribalismo mão no teto e chão no pé”.

 

 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

GOMES, Jomara Brandini. CASAGRANDE, Lisete Diniz Ribas. A educação reflexiva na pós-modernidade: uma revisão bibliográfica. Ver. Latino-Am Enfermagem. Set.out/2002.

<www.eerp.usp.br/rlaenf>

Acessado em 17/12/03

LIMA, Marco Antunes de. Pós-modernidade e teoria da História.

<www.klepsidra.net>

Acessado em 17/12/03

MONTE, Marisa. ANTUNES, Arnaldo. BROWN, Carlinhos. Os tribalistas. CD.

MOREIRA, Ruy. A pós-modernidade e o mundo globalizado do trabalho.AGB Curitiba. Revista Paranaense de Geografia. Nº 2 – 2ª ed. Julho/99

<www.agbcuritiba.hpg.ig.com.br>

Acessado em 17/12/03

OLIVEIRA, Cátia Patrícia de. O Armorial é pós-moderno.

Acessado em 17/12/03

PLANTAMURA, Vitangelo. Modernidade e pós-modernidade: pela renovação do

projeto de humanização. OEI-Revista Iberoamericana de Educación.  

<www.oei.org>

Acessado em 17/12/03

SIQUEIRA, Holgonsi Soares Gonçalves. Interdisciplinaridade, sinônimo de complexidade. Publicado no Jornal "A Razão" em 02.10.2003.

Acessado em 17/12/03


* Pedagogo com habilitação em Administração Escolar de 1º e 2º graus e Magistério das Matérias Pedagógicas de 2º grau. Professo Facilitador em Informática Aplicada à Educação pelo PROINFO - MEC - NTE MG2.

[1] WHITE, Hayden. The burden of History, History and Theory. 1966, p.56.