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EDUCAÇÃO & LITERATURA

 

VIRTUAL

Josué Geraldo Botura do Carmo[1]

Janeiro/2005

JOSUÉ GERALDO BOTURA DO CARMO

 

 

 

 

 "o virtual usa novos espaços e novas velocidades,

sempre problematizando e reinventando o mundo"

Pierre Lévy

 Afinal, o que é virtual?

Aurélio em seu dicionário vai dizer que a palavra virtual vem do latim escolástico virtuale[2] e vai definir como sendo aquilo que existe como faculdade, porém sem exercício ou efeito atual, aquilo que é suscetível a se realizar; potencial. Filosoficamente diz-se do que está predeterminado e contém todas as condições essenciais à sua realização. 

Virtual, na filosofia escolástica, seria aquilo que existe em potência e não em ato. O virtual tende a atualizar-se, sem ter passado no entanto à concretização efetiva ou formal. A árvore está virtualmente presente na semente. Portanto, o virtual não se opõe ao real mas ao atual: virtualidade e atualidade são apenas duas maneiras de ser diferentes.

 ”Desta forma, no virtual os limites de espaço e tempo não são mais dados e há um compartilhamento de tudo, tornando difícil distinguir o que é público do que é privado, o que próprio do que é comum, o que subjetivo do que é objetivo. Em outras palavras, no processo de virtualização - seja aplicado ao corpo, texto ou à economia - os lugares e tempos se misturam; as fronteiras nítidas dão lugar a uma fractalização das instituições e explode uma nova possibilidade de percepção do mundo, projeções, reviravoltas culturais, hipercorpo, intensificações com altíssimo impacto sobre a aventura da autocriação, enfim resplandecência do ser humano”. (LIMA, 2004)

Segundo LIMA (2004) Pierre Lévy em 1995 define as características da virtualidade dentro das novas concepções de tempo e de espaço: o desprendimento do aqui e agora, e da desterritorialização, contudo ele nos lembra que esse conceito foi extraído da filosófica clássica grega, sendo seu mentor Aristóteles em seu conceito de movimento e virtual[3], no século VI a.C., com acréscimos significantes de Levy.

Quando falamos em virtual logo nos vem à mente a imagem da Internet que se constitui em um computador com placa de modem, uma linha telefônica, um navegador e um provedor de acesso. Nem nos lembramos que o precursor do computador foi o ábaco. E que em 1450 Johann Gutenberg inventou a imprensa que significa hoje para nós as impressoras que temos em nossas casas. Assistimos dessa forma a transformação da cultura humana, hoje em alta velocidade, com máquinas com gigamemórias, navegando em banda larga. São milhões de computadores ligados em rede, com outros tantos milhões de internautas, em um espaço virtual, eliminando as distâncias e apagando as fronteiras entre a realidade e a simulação, como se assistíssemos o acontecimento, a essa nova dimensão do espaço o geógrafo brasileiro Milton SANTOS[4], segundo LIMA (2004) vai chamar de 5ª dimensão, que é a profundidade do acontecer. E a máquina passa a ser um substituto da inteligência, que também emite informações e com a qual o homem pode dialogar, como diria LOJKINE[5] (1995), segundo LIMA (2004).

Para ALBUQUERQUE (2004), graças às técnicas de comunicação e telepresença estamos aqui e lá ao mesmo tempo. Com aparelhos de visualização os médicos podem percorrer o interior do organismo. E ainda temos os enxertos, as próteses, as cirurgias plásticas, a alteração do metabolismo pelas drogas, regulando emoções ou controlando a reprodução. Para a autora tudo isso são aspectos de virtualização do corpo. Como diria Macluhan, segundo a autora: o automóvel é uma extensão das pernas, o computador uma extensão do cérebro, o binóculo uma extensão dos olhos.
 

Para SILVEIRA (2001) a conexão entre o real e o virtual produz novas formas de comunicação através de interações, que implica em nova forma de fazer política por meio do jornalismo, das relações públicas e marketing. QUÉAU[6] (1995), segundo a autora, vai dizer que o poder das técnicas de digitalização e de simulação vai permitir às escrituras virtuais desempenhar o papel de argamassa social, promovendo a união e a coesão. Para ele as tecnologias da virtualidade poderão facilitar a comunicação entre os homens. Um exemplo são os fóruns virtuais, com linguagem multimídia, que tornam possíveis amplos debates de idéias, transpondo os limites de espaço e de tempo, permitindo uma maior inteligibilidade do mundo, nessa nova esfera pública: são chats, grupos de discussão, mensagem instantânea, painéis de anúncios, serviços comerciais eletrônicos, publicações eletrônicas, bases de dados, etc.

 HANDY (2004) enfoca a virtualidade nas empresas onde se gerencia pessoas que você não pode ver nem controlar em todos os aspectos. E a tendência hoje é das organizações serem dispersas. As pessoas trabalham em diferentes escritórios e locais, possuem hábitos distintos e não são exclusivos de uma empresa. Nem todos precisam estar no mesmo lugar ao mesmo tempo para que o trabalho seja realizado. Assim temos os fornecedores, contratados, temporários, autônomos. VIANA (2004)  afirma que a Nike, maior indústria de tênis do mundo, não tem fábrica; e que a livraria Amazon, considerada a livraria de maior crescimento no mundo, não tem um metro quadrado de lojas. E ainda que a filial americana da Nokia fatura 200 milhões de dólares com apenas cinco empregados. O virtual abole a delimitação do território geográfico, expandindo suas possibilidades. O centro das atividades não fica restrito a um conjunto de salas e a um tempo inflexível. O tempo e o espaço adaptam-se ao ritmo de cada um, diluídos numa ampla rede de informação e comunicação, possibilitando um incremento qualitativo.

Lévy[7] (1996), segundo PAIS (2004), vai destacar quatro pólos do conhecimento: o virtual, o atual, o possível e o real. E para Lévy para se compreender o virtual é preciso fazer a distinção entre esses quatro pólos do conhecimento: o virtual, o atual, o possível e o real.

Assim o real está relacionado com a materialidade, pertence à ordem imediata das substâncias, das propriedades físicas e das determinações. Esses objetos reais têm seus limites claramente definidos e perceptíveis aos nossos sentidos. O possível é quando um objeto tem sua existência apenas idealizada no plano abstrato de um projeto ainda não executado. Ele existe no plano das idéias, restando apenas a sua existência material, para se tornar real. O virtual não é o oposto da realidade, apenas possui uma realidade que lhe é própria, sua natureza vai distanciar-se do atual pelo fato de envolver o abandono do território imediato. O virtual está próximo do possível, contudo não é da mesma natureza do possível, pois já tem implícito a resolução do problema, faltando apenas a realização. A noção de virtualidade está fortemente associada à criatividade. Esses quatro pólos do conhecimento: possibilidade, realidade, virtualidade e atualidade estão fortemente correlacionados. Os diversos movimentos envolvidos na passagem de um para outro desses pólos caracterizam diferentes situações da aprendizagem de um novo conhecimento.

Deleuze[8] (1996), segundo PAIS (2204), afirma que toda atualidade rodeia-se de uma névoa de imagens virtuais. Daí a importância de não se isolar os acontecimentos da atualidade como se eles não tivessem um passado, como se tivessem surgido do nada. O virtual e o atual estão essencialmente imbricados um ao outro, eles coexistem. É dessa forma que fazemos conexões de conceitos já formados para a formação de um novo conceito, que significa a expansão do conhecimento, que é o rizoma conceitual de Deleuze: o encadeamento de noções que cada vez se subdivide em novos espaços.

“O virtual sempre qualifica um conhecimento que está predeterminado a acontecer mas que permanece num estado de latência. Ele traz em sua essência um conjunto de condições suficientes para processar-se através de uma realização. O desafio maior é a passagem desse estado de latência para um acontecimento no plano da atualidade. De maneira geral, podemos dizer que o virtual está sempre disponível a se atualizar, pois traz em sua essência as condições suficientes para isso. Entretanto, é uma disponibilidade desafiadora. Ele tem todo o potencial necessário para viabilizar a passagem para o atual. O desafio maior para isso acontecer é justamente a criatividade dos sujeitos envolvidos na sua dinâmica. Esta é a direção sinalizada para uma nova educação contemporizada pelos desafios da era tecnológica da informática. (PAIS, 2004)

 “O virtual é algo que existe em estado de latência e de potencialidade e não como um acontecimento da atualidade. O virtual, no contexto geral do uso dos recursos tecnológicos da informática, evidencia a existência de um sistema mais caracterizado por suas potencialidades, do que como uma fonte de soluções prontas e acabadas. Está mais próximo de uma proposta desafiadora do que de uma fonte de soluções para os problemas particulares. A dinâmica virtual coloca em destaque um certo poder de fecundidade para possibilitar novas oportunidades de criação diante de situações cujas soluções são resistentes às condições do momento considerado. Por essa razão, acreditar nessa tendência é procurar inventar, descobrir ou fabricar melhores estratégias de ações diante das exigências do mundo digitalizado, principalmente, no que se refere ao conhecimento e suas implicações nas mais diversas áreas da ciência contemporânea”. (PAIS, 2004)

O virtual assemelha-se a uma fonte que jorra sem parar e em seu potencial traz a qualidade de sempre poder tornar-se atual, com uma vitalidade própria, sempre jovem.

 

 Referência Bibliográfica

 

ALBUQUERQUE, Helena C. A Virtualização do Corpo. Cap. 2.

<http://wwwusers.rdc.puc-rio.br/imago/site/virtualidade/producao/vitual-corpo-helena.html>

Acessado em 1º/12/2004.

CAMARGO[9], Denise. Não-sexo e desejo de virtualidade em Mapplethorpe[10]. FotoPlus - Paginas Negras 010.

<http://www.fotoplus.com/fpb/fpb010/b010c.htm>

Acessado em 1º/12/2004.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da língua portuguesa. 2ª ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986. p. 1782.

HANDY, Charles. A nova linguagem da Administração e as suas implicações para os Líderes.

<http://www.infonet.com.br/users/fviana/didatico/FBC-A-nova-linguagem-Administracao.htm>

Acessado em 1º/12/2004.

LIMA[11], Samuel. As Novas Tecnologias da Informação e o Conceito de Virtual: de Aristóteles à Pierre Lévy. NECOM - Núcleo de Estudos em Comunicação - Instituto Bom Jesus/IELUSC.

<http://redebonja.cbj.g12.br/ielusc/necom/rastros/rastros04/rastros0405.html>

Acessado em 1º/12/2004

NUNES[12], Fábio Oliveira. O ciberespaço e a virtualidade. Universia Brasil.

<http://www.universiabrasil.net/materia.jsp?materia=5652>

Acessado em 1º/12/2004

PAIS[13], Luiz Carlos. Noção de virtualidade e o encanto desvairado da tecnologia na educação escolar. Revista Eletrônica da UNESC - Ano 2 - Nº 3 - Maio/2004 - ISSN 1678-9652.

<http://www.unescnet.br/revistaeletronica3/ARTIGOS/TEXTO10.asp>

Acessado em 1º/12/2004

RIBEIRO[14], José Carlos S. O corpo na era da sociedade informacional. Artigos :: Ciberpesquisa - Centro de Estudos e Pesquisa em Cibercultura.

<http://www.facom.ufba.br/ciberpesquisa/art_jcarlos3.html>

Acessado em 1º/12/2004.

SILVEIRA[15], Ada Cristina Machado. Fóruns, política e virtualidade no horizonte da comunicação. PCLA. Volume 3 - número 1: outubro / novembro / dezembro 2001
<http://www2.metodista.br/unesco/PCLA/revista9/artigos%209-3.htm>

Acessado em 1º/12/2004.

VIANNA, Marco Aurélio Ferreira. Capital intelectual, um futuro que já chegou.
 <http://www.guiarh.com.br/PAGINA21B.htm>

Acessado em 18 de janeiro de 2004

 


 

[1] Pedagogo com habilitação em Administração Escolar de 1° e 2° grau e Magistério das Matérias Pedagógicas de 2° grau. Professor Facilitador em Informática Aplicada à Educação pelo PROINFO-MEC - NTE-MG2

[2] Palavra derivada da palavra virtus que significa força, potência.

[3]  "os conceitos reproduzem não as formas ou idéias transcendentes ao mundo físico, mas sim a estrutura inerente aos próprios objetos: a estrutura básica comum aos diferentes pássaros existentes é que estaria expressa, universalizadamente, no conceito pássaro". (Aristóteles, 1987:XVIII). Coleção Os Pensadores, Volume I, Editora Nova Cultural, São Paulo SP (1987).

[4] SANTOS, Milton (Organizador) et all. O Novo Mapa do Mundo - Fim de Século e Globalização, Hucitec-ANPUR, São Paulo (1997).

[5] LOJKINE, Jean. A Revolução Informacional, Cortez Editora, São Paulo SP (1995)

[6] QUÉAU, Phillipe. Lo virtual. Virtudes y vértigos. Barcelona: Paidós, 1995.

[7] LEVY, Pierre. O que é o virtual? Editora 34. São Paulo. 1996.

[8] DELEUZE, Gilles. O Atual e o Virtual in Deleuze Filosofia Virtual de Éric Alliez. Editora
34. São Paulo. 1996.

[9] Jornalista, fotógrafa e atual editora da revista IRIS.

[10] Ensaio realizado para a disciplina Deus Ex-machina - Rumo à Civilização Místico-Tecnológica, do programa de pós-graduação da Escola de Comunicação e Artes - USP em agosto de 1997.

[11] Jornalista e Mestre em Engenharia de Produção e Sistemas pela UFSC. RASTROS revista virtual do núcleo de estudos em comunicação

[12] Professor universitário de computação gráfica e webdesigner e doutorando em Artes pela USP.

[13] Doutor pela Universidade de Montpellier, França, professor do Departamento de Educação da UFMS e pesquisador da área de Educação Matemática

[14] Mestrando, Faculdade de Comunicação, UFBa. jcsr@bahianet.com.br
 

[15] Universidade Federal de Santa Maria - RS, Brasil