VOLTAR À PÁGINA INICIAL 

 

EDUCAÇÃO & LITERATURA

 

JOSUÉ GERALDO BOTURA DO CARMO

 

REFLEXÕES SOBRE A POLÍTICA ATUAL DOS SISTEMAS EDUCACIONAIS 

Josué Geraldo Botura do Carmo[1]

Abril/2002


 

 

 

 

Para refletirmos sobre os sistemas educacionais temos que ter por base a cybercultura em sua relação com o saber: a velocidade com que o saber hoje chega até nós, e a velocidade com que ele se renova. As competências adquiridas no inicio de nossa formação profissional vão ficando obsoletas no decorrer do exercício da profissão. Daí a fremente necessidade de estar-se em constante atualização. Trabalhar equivale cada vez mais a aprender, transmitir saberes e produzir conhecimentos. As tecnologias intelectuais do ciberespaço vão alterar as funções cognitivas humanas tais como a memória através dos bancos de dados, dos hipertextos; a imaginação através de simulações, a percepção através de realidades virtuais; o raciocínio através da modelização de fenômenos complexos. Tudo a favor da incrementação do potencial da inteligência coletiva dos grupos humanos. A partir daí é preciso mais do que nunca repensar o problema da educação e da formação do indivíduo. Os programas e currículos a partir de agora, devem ser personalizados uma vez que os percursos e os perfis de competência são singulares. Novos modelos do espaço do conhecimento estão sendo construídos. A educação não suporta mais esse modelo de representação em escalas lineares e paralelas, essa estrutura piramidal organizada em níveis com base em pré-requisitos, com um começo e um fim. A arquitetura proposta agora, é de espaços de conhecimentos emergentes, abertos, contínuos, em fluxos, não-lineares, que se reorganizam conforme os objetivos ou contextos, respeitando os interesses e o ritmo de cada um.

Lévy vai propor duas grandes reformas dos sistemas de educação e formação. Primeiro é a adaptação dos dispositivos e do espírito do aprendizado aberto e a distância, no cotidiano da educação, um novo estilo de pedagogia que favoreça os aprendizados personalizados e o aprendizado cooperativo em rede. Para ele o papel do professor neste novo contexto será o de animador da inteligência coletiva de seus grupos de alunos. A atividade maior do professor agora é o acompanhamento e o gerenciamento dos aprendizados, incitando ao intercâmbio dos saberes.

A segunda reforma de acordo com Lévy vai envolver o reconhecimento do aprendido. Para ele os sistemas de ensino públicos devem assumir o papel de orientar os percursos individuais no saber e contribuir para o reconhecimento do conjunto de know-how das pessoas, incluindo aí os saberes não-acadêmicos. Uma vez que os indivíduos aprendem cada vez mais fora das fileiras acadêmicas, cabe aos sistemas de educação implementarem procedimentos de reconhecimento dos saberes e know-how adquiridos na vida social e profissional. 

O ciberespaço é profuso, aberto, heterogêneo e não-totalizável, nele há interatividade, reflexão. E é dentro destes conceitos que o novo modelo de educação e de formação está sendo construído. A transformação é constante e em grande velocidade, tudo flui e escoa-se. A informação transborda... “Cada reserva de memória, cada grupo, cada indivíduo, cada objeto pode tornar-se emissor e fazer aumentar o fluxo.” O ciberespaço vai nos dizer que “tudo” está definitivamente fora de alcance. Vamos navegando, surfando, enfrentando ondas, turbilhões, correntes e ventos contrários, não mais escalamos pirâmides. E os suportes de informação vão contribuir para a estruturação da “ecologia cognitiva” das sociedades, determinantes de seus valores e seus critérios de julgamento. Destotalizado, o saber flutua, favorecendo os processos de inteligência coletiva nas comunidades virtuais. O ideal mobilizador da informática deixa de ser a inteligência artificial para se concentrar na inteligência coletiva: memória, imaginação e experiência. O ciberespaço, interconexão dos computadores do planeta, tende a tornar-se a maior infra-estrutura da produção, da gestão, da transação econômica. Será em breve o principal equipamento coletivo internacional da memória, do pensamento e da comunicação. E com esse novo suporte de informação e comunicação emergem gêneros de conhecimentos inéditos, assim como os critérios de avaliação para orientação do saber.

Há na atualidade um grande número de pessoas interessadas em uma formação educacional, clientela essa amplamente diversificada, em um momento em que a velocidade da evolução dos saberes é muito grande.

No Brasil, nem todos ainda têm condições de freqüentar o ensino médio. Nas universidades não há vagas. Os dispositivos de formação profissional e contínua estão saturados. É impossível aumentar o número de professores proporcionalmente à demanda, diversa e maciça. A saída está em técnicas capazes de multiplicar o esforço pedagógico dos professores e formadores. Audiovisual, “multimídia” interativa, ensino assistido por computador, TV. educativa, cabo, técnicas clássicas de ensino a distância fundamentadas essencialmente na escrita, monitorado por telefone, fax ou internet, é preciso pensar em todos os recursos disponíveis, de acordo com a realidade de cada região, num país de grande diversidade como o nosso. Tanto no plano das infra-estruturas materiais quanto nos custos de operação, escolas e universidades virtuais custam menos do que as escolas e universidades presenciais. Os cursos não-presenciais poderão atender a uma maior população e com melhor qualidade, um ensino personalizado, capaz de atender a diversidade, às reais necessidades e à especificidade do trajeto de vida de cada um.

Com os recursos das novas tecnologias programas educativos podem ser seguidos à distância pela WWW. Os correios e as conferências eletrônicas servem para monitoração inteligente, postos a disposição de uma aprendizagem cooperativa. Os suportes hipermídia permitem acessos intuitivos rápidos e atrativos a grandes conjuntos de informação. Sistemas de simulação permitem que nos familiarizemos de maneira prática e barata com objetos ou fenômenos complexos sem termos que nos sujeitarmos a situações perigosas, difíceis de controlar ou de alto custo. A distinção entre ensino presencial e a distância será cada vez menos pertinente. Em um breve futuro teremos uma mescla de presencial e virtual, tanto nos cursos presenciais como nos não-presenciais. Este tipo de ensino está em sinergia com a nova administração que está sendo implantada pela nova geração de administradores. É uma geração de autodidatas. A direção mais promissora, que define muito bem a perspectiva da inteligência coletiva no campo educativo é a do aprendizado cooperativo.

Nos campos virtuais, professores e estudantes compartilham recursos materiais e informacionais, onde todos aprendem. Pode-se participar de conferências eletrônicas desterritorializadas, com os melhores pesquisadores da área.

Os computadores podem ser usados como instrumento de comunicação, pesquisa, informação, cálculo, produção de mensagens através de textos, e/ou imagens, e/ou sons. O ciberespaço vai propiciar novas possibilidades de criação coletiva, de aprendizado cooperativo e de colaboração em rede, forçando o repensar da educação e dos modos habituais da divisão do trabalho.

Caberia portanto ao poder público, segundo o autor, garantir a cada cidadão uma formação elementar de qualidade; permitir a todos um acesso aberto e gratuito a mediatecas, centros de orientação, documentação e autoformação, a pontos de entrada no ciberespaço, sem negligenciar a indispensável mediação humana do acesso ao conhecimento; e regular e animar uma nova economia do conhecimento, na qual cada indivíduo, cada grupo, cada organização sejam considerados como recursos potenciais de aprendizado ao serviço de percursos de formação contínuos e personalizados.

 Referência Bibliográfica

 Pierre Lévy

EDUCAÇÃO E CYBERCULTURA

Trecho da obra «Cybercultura» a ser publicada a 21 de novembro pela editora Odile Jacob (França). 

 

[1] Pedagogo com habilitação em Administração Escolar de 1º e 2º graus e Magistério das Matérias Pedagógicas de 2º grau. Professor Facilitador em Informática Aplicada à Educação pelo PROINFO – MEC.