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EDUCAÇÃO & LITERATURA

JOSUÉ GERALDO BOTURA DO CARMO

 

A UTILIZAÇÃO DA SALA DE INFORMÁTICA NAS AULAS DE LÍNGUA PORTUGUESA E LITERATURA

Josué Geraldo Botura do Carmo[1]

Fevereiro/2002

 

 

 

Clarmi Regis vai dizer que a escrita determinou um caminho aberto a ser seguido pela espécie humana. Hoje a memória não é tão necessária como na época da Grécia antiga. Na rede intertextual a palavra escrita garante a preservação do pensamento e o abre a mil possibilidades. A partir de Guttenberg o desenvolvimento da tecnologia vem servindo de suporte e de instrumento que possibilita o registro e a difusão das idéias. A palavra impressa permitiu que a literatura e a arte se difundissem.

Se a imprensa deu voz aos tempos modernos, a Internet dá voz aos tempos pós-modernos. Um novo estilo de humanidade está se criando. É o abandono da página concreta, da ordenação visível das páginas, da linearidade. Surge agora a possibilidade de múltiplas associações, a margem de iniciativa, a singularidade das interpretações permitidas a partir das associações disponíveis. Tudo se transforma em um grande questionamento. Cria-se um jogo de comunicação com os textos lançados na rede. O sentido vai emergir da construção do contexto, das inter-relações propostas. Os agentes do jogo tecem a sua própria rede, o seu próprio hipertexto, a partir de possibilidades apresentadas e de outras tantas por eles mesmos propostas.

Para o pensamento determinista que condiciona o raciocínio isso é o caos. Contudo, para entendermos, precisamos acompanhar as correlações que caracterizam o caminho da percepção e do entendimento, o contexto de cada um, suas vivências, seus conhecimentos anteriores, e sua visão de mundo.

Fred FOREST, em sua análise da arte contemporânea, afirma: "Les technologies életroniques ont la possibilité fonctionnelle d’agir comme un dispositif de contact à distance, c’est à dire de modifier fondamentalement les modes de présence."[2]

Portanto precisamos nos aprofundar no conhecimento das múltiplas possibilidades apresentadas pelas tecnologias intelectuais enquanto redes de interfaces para a criação literária e para o estudo de Língua e Literatura. Precisamos desmistificar, conhecer e empregar as tecnologias da inteligência.

“Um campo de novas tecnologias abre-se, de forma incerta e conflituosa, às mais diversas experiências. O uso dessas tecnologias, a introdução de computadores nas escolas, a criação de uma rede telemática são etapas que conduzem a um processo progressivo de instauração de uma tecnodemocracia, pois inegável é constatar-se que o emprego que se faz (ou se fizer) das tecnologias intelectuais carrega consigo, de forma clara ou diluída, um programa político-social, um projeto cultural. Campo aberto, que abre caminho para a ‘redistribuição da configuração do saber’, a informática se apresenta como a possibilidade de escapar do determinismo tecnológico e de instalar o coletivo pensante. Ao mesmo tempo, exige que se proceda a uma revisão da filosofia política e a um repensar da filosofia do conhecimento”.

A interatividade que a informática possibilita vai permitir que o leitor não apenas elabore sua própria leitura, mas também construa o material de que pretende fazer uso ou a forma artística que sua liberdade inventiva vier a determinar.

“As novas tecnologias transformam as configurações do imaginário, permitem novas formas de criatividade e de expressão, criam o ambiente para a realização da vocação natural da arte”.

E a integração de variados elementos como imagens, palavras, sons, vão dar ao texto uma dimensão multimídia, potencializando as possibilidades de conexões e fazendo do leitor o criador do próprio texto dentro de uma infinidade de combinações possíveis “a vontade do freguês”.

“Talvez o mais importante de tudo seja a possibilidade funcional de, por meio das tecnologias da inteligência, contatos à distância serem mantidos. Modifica-se, assim, a forma de presença do homem junto ao homem, quando são ultrapassadas barreiras de tempo e espaço e feita a descoberta de um novo contexto. O ser humano e sua cultura abrem-se para o universo”.

Luiz Carlos e Adair propõem o uso do computador como ferramenta de trabalho nas aulas de Língua Portuguesa e Literatura, como forma de incentivo à leitura e à produção de textos, oportunizando-as na tela do computador e no livro paralelamente, sem priorizar ou menosprezar um ou outro processo, pois um pode estimular o outro e ambos podem coabitar o mesmo espaço, fazendo da escola um reduto para se ler, criar, produzir, independente da mídia utilizada. Buscando uma leitura prazerosa, vinculada a razões e finalidades sociais.

O uso do computador vai alterar a rotina escolar e os métodos de organização de trabalhos, pois os processos de leitura e escrita estão integrados em um contexto estrutural de mudança do ensino-aprendizagem, onde todos, professores e alunos vivenciam processos de comunicação abertos, de participação interpessoal e grupal.

No hipertexto o trabalho de interpretação e produção própria caminham lado a lado com o de compilação. Prioriza-se a construção de um conhecimento através de erros e acertos e da internalização das informações.

Para Adair o ensino da Língua Portuguesa não pode se restringir à transmissão de regras gramaticais, e a leitura pode ser uma atividade incentivadora da produção de texto daí a importância de se buscar alternativas de trabalho para as aulas de Língua Portuguesa e Literatura juntamente com as novas tecnologias que permitem uma facilidade na socialização das tarefas escritas de cada aluno, o que dá um significado para o ato de escrever. E a leitura não é uma atitude passiva, não é simplesmente decodificar sinais gráficos, mas reconstruir sentidos. A leitura requer diálogo com o interlocutor. A leitura é também escrita. Um texto literário apresenta sempre o duplo escritura-leitura, é uma rede de conexões a atravessar por várias formações discursivas. Um sempre complementando o outro. O texto é composto de signos que variam com o contexto, anunciando vários discursos e fazendo despertar o adormecido.

A utilização do computador em sala de aula pode oferecer meios de divulgar e socializar a produção escolar. O ato de compartilhar o texto com outras pessoas dá sentido à redação escolar. E além do mais as ferramentas disponibilizadas por alguns programas de edição de texto auxiliam os alunos e o professor na correção ortográfica e gramatical. O hipertexto altera a visão da redação escolar e da pesquisa, sua forma de composição, estruturação e de leitura, sua forma tipográfica e topográfica promove diferentes modos de pensar, formas de organizar o pensamento e a ação. É uma nova forma de se relacionar com o conhecimento, um novo tipo de acesso ao patrimônio da cultura humana. O hipertexto desafia, exige e estimula o intelecto, sua produção requer operações intelectuais que vão desde o manuseio da escrita, da imagem, do som, até a escolha da melhor cor, tamanho e tipo de letra. Essas atividades exigem atenção, abstração, capacidade de comparar e diferenciar. É sem dúvida uma rede infinita de comentários e debates. A transgressão do espaço do papel à tela do computador oferece uma liberdade de compilação, e o cruzamento de informações acontece de forma natural, pela sua capacidade de armazenamento.

O hipertexto vai se revelar como uma prática literária de exploração e descoberta das possibilidades de expressão da linguagem verbal e não-verbal, libertando o sujeito de certas restrições materiais. O jogo duplo de leitura e construção insere o texto num processo em constante movimento, pois ele jamais se encerra, pois sua estrutura é móvel, cada signo é a janela para outro texto. E ao mesmo tempo em que o indivíduo filtra as informações elas são vaporizadas e o texto renasce a cada link efetuado, a palavra é semente que germina, e brota uma nova página através de seu potencial criador.

Adair vai dizer que, segundo Kristeva[3] o diálogo comumente estabelecido entre os textos é uma seqüência duplamente orientada pelo ato de reminiscência – a necessidade de chamar outro texto – e pela somatória, a transformação dessa escritura. Essa junção de sintagmas onde um endereça-se ao outro se dá por significação, descrição, narração num ato de complementação, mas também por exclusão abrindo espaço para a coexistência de paradoxos. O texto gerado e o compilado estão presentes um no outro, numa relação dialógica.

  

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

LÍNGUA E LITERATURA NO ESPAÇO INTERATIVO: O COLETIVO PENSANTE

Clarmi Regis

Mestranda em Literatura Brasileira – UFSC 1999

 Literatura e Informática

Luiz Carlos Neitzel

Adair de Aguiar Neitzel

Leitura e escrita: um processo geminado

Adair de Aguiar Neitzel

Doutoranda em Literatura - UFSC

Professora da Rede Pública Estadual de SC

 

 


 

[1] Pedagogo com habilitação em Administração Escolar de 1º e 2º grau e Magistério das Matérias Pedagógicas de 2º grau. Professor Facilitador pelo PROINFO – MEC. http://planeta.terra.com.br/educacao/josue

[2] "As tecnologias eletrônicas têm a possibilidade funcional de agir como um instrumento – um dispositivo – de contato à distância, ou seja, de modificar fundamentalmente as formas de presença."

 [3] KRISTEVA, Julia. Semeiotike: Recherchers pour une sémanalyse, coleção Points - Essai, Editions du Seuil, Paris.